27 de dez. de 2010
Sobre o que penso que sentem
Mais um ciclo que se acaba.
Às vésperas do meu rito de passagem,
Então volto às minhas linhas.
Releio o que andei escrevendo ao longo desta última volta ao redor do sol.
Destes últimos 12 meses idos. Do ano que termina em zero. Uma década findada.
De fato escrevi coisas tristes, coisas secas, coisas choradas...
Fui viúva, cética, fui rocha, fui qualquer coisa exagerada.
Fui os piores momentos transcritos, os bons momentos guardados em segredo.
Escrevi sobre o amor.
Sob a minha ótica, sob os personagens que construí ao ver os amantes caminhando ao meu redor.
E dando continuidade a todas as eras cíclicas de mundo, novamente o amor e os sentimentos intensos humanos é que servem de matéria prima pra qualquer coisa outra que se ouse escrever.
Quem me lê, me vê passando na rua, me olha e me sorri cordialmente não entende das minhas intensidades, da minha matéria de poesia.
O ano que se finda, os textos que ficaram para trás me deixam um sentimento de sobriedade de mim mesma.
Sóbria, sinto que posso sentir o sentimento do mundo.
Que cada pessoa que vejo chorando e sorrindo pela rua, que me faz escrever sobre o amor, me empresta um pouco da dor do seu peito pra preencher o espaço que cabe às minhas palavras.
O que tenho a dizer neste texto de fim, é que encerrei muita coisa este ano!
Em nome dos que amam e me inspiram!
Espantei meus fantasmas, minhas reticências, meus medos...acabou!
O ano acabou e estou renovada!
Estou nova!
Estou começando de novo tudo e todas as coisas!
Estou por fim, feliz!
Feliz com todo o movimento de amor que me ensinou tanto sobre o mundo!
Feliz porque sou outra, porque me sinto beija flor, porque tenho outros olhos, outros afetos.
A última volta de existir foi de movimento.
E pretendo ainda escrever por aqui o que penso deste movimentar, saculejar, sacudir.
Movimentar-se é estar vivo.
E rindo de mim mesma e dos meus textos antigos, me sinto não mais do que viva e pulsante.
Neste fim de ano, pulso.
Pulso pelo novo!
Pulso porque não tenho pena dos amantes, das viúvas, dos que sofrem, dos que transpiram amor, porque não sinto pesar pelos que retratei em todos os meus versos de amar.
Hoje todos devem também estar em movimento.
E tão felizes quanto eu.
Eu que tenho escrito sobre o que penso que sentem.
23 de dez. de 2010
Encontrar é transcender
Pela lei do acaso que segreda o futuro e enche as coisas de surpresa, cada um de nós podería, caso o nosso pai e a nossa mãe não tivessem se encontrados por uma rede de causalidades, ter sido comido por uma vaca atrás da moita. Se o esperma que penetrou o óvulo - o que nos fez juntamente com o óvulo da mãe -, tivesse saido por uma safirinha atrás da moita, já era. Não estaríamos aqui. E nem a vaca. Deixa ela prá lá!
Estamos aqui com sovaco, nariz, ânus e mais um monte de órgãos. Alguem que tem sovaco, nariz e ânus pode dizer que é superior aos outros seres?
Numa madrugada relativamente ébria e poética, por uma conversa livre com o meu amigo Ailton-mestre, depois que ele me perguntou O QUE É A LUZ POR DENTRO, eu lhe expliquei que embora existindo a arte, a filosofia, as religiões, as ciências, assim como castelos suntuosos, astronaves incríveis, conhecimentos que fundem espécies, adiantam o tempo da natureza etc, como realizações do ser humano, ninguem escapa da democracia de Deus – a carne. Disse a ele que a carne é a democracia de Deus. Pela carne todos somos filhos do tempo. E a ele somos subordinados.
A carne vibra, fede, tem poros, sente, brilha, possui força, adoece, cria mas é perecível. Não temos direito de bostejar valores acima do outro por conta da carne. Não precisamos temer a eternidade das tiranias por conta da carne. Não precisamos sofrer demais com pequenos erros, grandes culpas, incautos jeitos pois somos carnes andantes, carnes falantes, carnes éticas. A carne é árvore frondosa submetida às leis das estações vitais.
Mas há beleza. Há muita beleza. Ter vindo do útero e saudar a luz, a cultura e a história. Aprender a falar, a amar e abraçar. Rir e chorar; cantar e silenciar; ver e querer; sonhar e agir. Um se junta ao outro; o outro vem de outro; aquele de outro. E de repente alguns se encontram no mesmo tempo e no mesmo espaço. O acaso pode ser o milagre. O milagre pode ser a consciência. E esta a mãe de todas as ações.
Parece que o Encontro nos eleva mais que a situação de carnes. Encontrar é transcender.
19 de dez. de 2010
O que sou
Por nada.
É muito injusto e duro que a culpa de tudo seja sempre minha.
A culpa pelos fracassos.
Já fui amada antes, exatamente como sou.
Haverão de me aceitar em algum momento, assim.
Vou me permitir me entristecer.
Porque é digno de tristeza.
Mas me culpar, não mais.
Não me importarei com as opiniões a meu respeito.
A partir de hoje serei. Pura e simplesmente. E mais nada.
13 de dez. de 2010
Sobre os gatos
Declaro abertamente o desprezo que tenho por eles.
Me incomodam!
É. Talvez não se trate de desprezo... se há incômodo, há qualquer coisa que me toca.
Independência, barulho, noite, pêlos, sedução...
Há qualquer coisa de malandragem que me agride.
Da sarjeta, dos becos úmidos, da luxúria noturna sobre meu teto, da superstição.
Vão embora, gatos!
Sejam engolidos pela minha mente embriagada de desamor!
Perturbem outro! Arrumem outra casa! Enfrentem outros corações moribundos!
Se retirem daqui com tudo de felino que trazem!
Levem consigo essa noite, esse sonho. E não voltem mais!
9 de dez. de 2010
A sua chegada
Mas não é raiva.
É só ansiedade costumeira.
Tenho novas ansiedades...
Findado o mês de outubro muita coisa nova começou.
E já que são novas, que nada se repita!
O fim de outubro me trouxe um novembro doce... doce novembro...
Me trouxe nova rotina, novos sabores, nova cintura.
Me trouxe novos pares de sapatos, outras escadas.
Me trouxe novos cheiros. Um novo cheiro. Com seu pescoço que me é novo.
Com seus instantes que eu desconheço.
Essa novidade que me intriga, que me instiga, que tenta me desvendar.
Um desenrolar tranquilo, uma doçura imponente.
De repente me deparo com um novo, novo demais!
Um novo completamente nunca provado!
(...)
Guardarei minhas palavras pra um momento mais oportuno.
Por agora queria dizer que gostei da sua chegada no meu mundo. Pela porta da frente.
7 de nov. de 2010
A conclusão que tiro da vida
Vagamente sinto qualquer coisa ou hormônio que me possa dar uma sensação aconchegante de estar viva.
Vagamente percebo que, pra grande parte do mundo, passo despercebida.
Que, embora o poeta tenha dito que "se não houvesse eu no mundo, o mundo não seria o mesmo, porque haveria eu a menos"... não sei. Acho que se houvesse eu a menos no mundo, ele nem se daria conta.
Mas não escrevo isso com nenhum pesar, ou tristeza profunda, ou melancolia suicida.
É apenas uma constatação lúcida que faço ao entender a cada dia mais que minha existência interessa e faz diferença pra ninguém mais que a mim mesma.
Não duvido que haja uma meia dúzia de pessoas que se interessa por minhas novidades.
Mas de qualquer maneira, no dia a dia, na corriqueira atividade de existir, meus pequenos detalhes são só meus. E mesmo que houvesse alguém compartilhando da minha cama, meu teto, minha comida, todos os meus detalhes continuariam sendo meus e de mais ninguém.
É coisa minha pensar no que comi hoje, avaliar se minha garganta e minha cabeça doem e se isso é sinal de que estarei levemente gripada pela manhã.
O dia de preguiça que passei jogada no sofá, os filmes ruins que escolhi na locadora.
Essa sensação angustiante de solidão que sempre me acomete nos domingos à noite.
Todos esses detalhes de mim são meus. Apenas. E só eu vou me lembrar deles no futuro.
É essa a conclusão que tiro da vida. Podemos achar gente que compartilhe conosco gostos e momentos. Mas nascemos e viemos pra sermos sozinhos.
Ninguém nunca poderia estar aqui comigo neste exato momento, sentada à cadeira, um copo de água gelada à direita, um abajour desligado, os músculos do pescoço contraídos,uma vontade de não estar só, o silêncio barulhento da noite da cidade que me atormenta pela janela aberta.
Ninguém além de mim desfruta disso agora.
30 de out. de 2010
O que aprendi no mês de outubro
Final de tanta coisa.
No simbolismo dos finais nem sei por onde começar pra conseguir dizer sobre os ciclos que encerrei neste tempo último.
Encerrei mais um capítulo de ilusão. Um capítulo comprido que só provou que a gente tem que prestar atenção ao que se escancara aos nossos olhos. Tudo o que parece muito claro, de fato é. E não adianta fantasiar borboletas. Nunca adiantou.
Aprendi que ter esperanças é válido. Mas esperar pra sempre é derrotismo e estagnação.
No entanto, também aprendi que a esperança pode trazer coragem, auto-crítica, elucidações.
Aprendi que posso me surpreender muito (tenho treinado minha coragem de assumir minhas vontades).
Nesses tempos idos aprendi que o ser humano é confuso, perdido, dissimulado... tudo isso todos nós somos ou podemos ser, mais dia, menos dia. O que não podemos é ter conosco gente má. E dessas, devemos nos livrar.
Tenho aprendido que se deve mudar... mudar os cabelos, as unhas, o medo da dor, mudar de emprego, de ares, de lugares. E por mais que isso tudo dê medo, não compensa levá-lo em consideração. Sentí-lo sim, compensa. Compensa sentir tudo!
Aprendi que nada em mim é digno de vergonha. Que vergonha é coisa de gente infeliz.
Entendi que o mundo tá cheio de gente, de prazeres e de oportunidades escancaradas à minha frente, bastando que eu liberte meu campo energético das minhas neuroses e obsessões conservadoras, pra que ele inunde todo esse espaço de novidades deliciosas.
Eu aprendi que por onde passamos deixamos rastros. E que cabe a nós fazer desses rastros sinais bons ou ruins de nossa passagem.
Percebi que quando os sinais são bons, você recebe sempre desejos de boa sorte e sucesso pro resto da jornada. Sem contar nos "estarei aqui sempre que você precisar", que são tão bons de se ouvir.
Uma nota importante e que não pode ser deixada de lado é que o único jeito de se deixar pessoas, coisas ou lugares, é somente deixando. Nunca existirá outro jeito.
É preciso ter momentos marcantes, pra delimitar o tempo e construir a memória desses dias. Mas pra sempre, o único jeito de deixar vai ser dizendo adeus e saindo pela porta sem olhar pra trás.
É importante também, e fundamental, que não se perca muito tempo fazendo projeções de futuro. Nada disso vai acontecer. E o que vai de fato, vai chegar de maneira totalmente imprevista.
Portanto, só o que temos a fazer é entender que tudo na vida é uma fase. Que por essa fase passarão pessoas. Que você passará por elas. Que haverá muitos aprendizados. Momentos bons e ruins. Novas rotinas a serem depois modificadas e deixadas para trás.
Aprendi que é preciso aceitar com serenidade e paz o fim desses ciclos. E purificar o corpo e a alma para receber os próximos.
Por falar em corpo... acho que tenho aprendido que ele deve ser explorado e usufruído em toda a sua plenitude. Ele é nosso templo. E é sacro.
Por fim, o fim do mês de outubro.
Tenho aprendido com ele também, que não só ele se acaba, mas a vida. Tenho visto a vida minguar e se despedir diante dos meus olhos. Num movimento profundo, natural, inevitável, ininterrupto. E justamente por isso, é preciso vivê-la!
Outubro vai se despedindo, enquanto eu, à beira de um feriado, morro de calor nessa noite quente, no silêncio da penunbra do meu quarto, pensando na vida, e... de novo (como há muito tempo não se via) sem sono na madrugada!
13 de set. de 2010
Outono
Pra saber lidar com gente ruim.
Ter um pingo a mais de insanidade e um quê de violência
Pra conseguir fazer desaparecer gente ruim.
Queria eu ao menos esquecer das convenções sociais, das boas regras de convívio, das pessoas certas do mundo,
E simplesmente quebrar a cara de gente ruim.
Gritar, esbravejar, puxar pelo colarinho, cospir.
A qualquer momento, em qualquer lugar.
Mas eu sou só ingênua, peito aberto demais, carga exagerada de emoção
Essa dificuldade de pensar duas vezes antes de sair abraçando...
A mania irritante de acreditar nas pessoas e esquecer do quão ruins elas podem ser.
Quisera eu ser diferente.
E voltar no tempo. Ao menos uma vez.
Hoje seria um outono alemão colorido.
Aberto a mil possibilidades.
Aberto. Ingênuo. Emotivo.
Mas ao menos seria outono. E não seria aqui.
9 de set. de 2010
Me queira!
e de novo e de novo
eu penso
eu penso
Me viro, olho pro lado,
Algumas linhas,
Um copo d´água.
Eu penso
Obsecada.
12 de ago. de 2010
Atropelo
A cidade está azul e quente como deveria ser,
Os desafios e os vestidos seguem adiante, aumentando a ludicidade dos dias.
Até tenho feito coisas diferentes, conhecido pessoas.
Estou quase radiante.
Planejo. Ou não.
E aí me atropela uma fagulha da sua existência.
Que não necessariamente me causa desconforto.
Mas me lembra que você está por aí. Sendo.
Aí não tem jeito...
eu me lembro mesmo que te amo.
3 de ago. de 2010
A graça das coisas
Como aquela vontade de morrer só um pouquinho que dá de vez em quando.
Que logo na sequência é substituída por sopros imensos de esperança e planos e vontades e euforias...
Como as pessoas que passam sem que a gente perceba
E ao passar podem ser tudo, podem esconder tantas histórias, todos os segredos, podem trazer chatas surpresas consigo ou exatamente tudo aquilo que precisávamos.
Nunca as encontraríamos, se nunca tivéssemos, ao acaso, seguido naquela torta direção.
As coisas que planejamos têm assim, também, a sua peculiaridade. Sobretudo quando nos geram frustrações.
Nada irrita mais que as coisas que sabemos e sentimos que vão dar errado, mas que mesmo assim cavamos calejando as próprias mãos e enchendo as unhas de terra.
As coisas do mundo são todas elas engraçadas,
E esses dias malucos que trazem de cada vez essas bagunças, ah! Acho que eles também se riem de mim...
29 de jul. de 2010
O Fundo
Olhando pras roupas no armário
Como quem tudo enxerga e nada vê.
Não consigo absorver nada ao meu redor
A não ser minha dor de cabeça.
A não ser você com ela.
A não ser ela tomando de mim o seu sorriso.
E aqui, parada e apática, penso em como reagir ao mundo.
Parada como o segundo certeiro que determina de que lado da ponte vai cair a moedinha dos desejos que atiramos fora.
Apática como os velhinhos que observam inertes de suas janelas o movimento das ruas pela manhã.
Estico as pernas sobre a coberta de retalhos.
Eu não sei o que fazer.
Não dá pra decidir nada enquanto essas lágrimas caem.
É impossível organizar as idéias, se só o que eu consigo pensar é em como isso tudo é injsuto.
Ter que conter esse choro é mais injusto ainda.
Eu queria era dar uma de louca varrida,
Te sacudir e te gritar, te mostrar onde sangra, te pedir pra parar, pra começar...
Eu queria tanta coisa...
Mas o soluço é profundo,
E sem respirar, já nem sei mais dizer o que eu queria.
Ter você aqui agora já seria bom...
Mas eu não sei o que fazer.
*Goiânia do Fundo, de um chão qualquer, 20/05/10
25 de jun. de 2010
Caio Fernando Abreu
8 de jun. de 2010
Contrapartida ao mundo
Ausente de tentar compreender o mundo, de tentar interpretar demais aquele rapaz.
Tenho estado ausente das minhas dores, ausente das recordações inúteis.
Tenho esquecido de neurotizar minha vida.
Na verdade, tenho prestado mais atenção na física quântica,
Nas esperanças de amor que sempre restam,
No jeito descontraído que ele usa pra falar comigo,
Na leveza do trato que temos tido um com o outro,
Que tenho comigo mesma,
Com as coisas todas.
Tenho prestado mais atenção nas minhas curvas, nos meus sapatos, nos meus silêncios.
Silêncios...
Tenho aprendido a escutar o silêncio, tenho tentado me silenciar, e sorrir mais, e dizer mais com meus olhos e meus cafunés...
Tenho gostado mais disso tudo, de estar aqui, de me movimentar...
Tenho sentido prazer. Em outras coisas. E até na ausência que me causam as minhas frustrações.
Tenho tentado rir da minha meninice mimada, que se descontrola a cada vez que algo sai do que planejei para a noite, o fim de semana, aquele momento.
Meu corpo continua clamando pelo encontro, pelo suor, pelo seu pescoço,
Mas é só uma questão de tempo e momento.
Vamos nos colidir em breve.
Estou do jeito certo, no lugar certo, exatamente como haveria de ser.
Em detrimento à monotonia de outrora, hoje espero com suavidade o que o mundo tem a me trazer,
E tenho muito a deixar por aí, em contrapartida!
17 de mai. de 2010
Monotonia
Hoje acordei descrente.
Com preguiça até de manifestar minha descrença pelo mundo.
E eu gosto das coisas aparentes
Porque elas me permitem gritar o meu descaso sufocante,
Sem que eu gaste a pouca energia que me sobra nesses dias.
Não há um motivo.
Mas tudo parece colaborar.
Meus cabelos desarranjados
Com cachos definidos de rebeldia
E cara de anos sessenta que eu adoro,
Contribuem pra que eu sustente e ostente a minha cara de pouco caso.
Minhas unhas, com esmalte vermelho descascado,
Comprovam o glamour decadente deste dia.
A péssima música de uma cantora com voz forçada e melodias medíocres toca no computador do escritório.
Lá fora chove.
Uso uma camiseta verde desengonçada
E sinto fadiga só de pensar que essa sem-graceza de dia mal começou.
Hum...
Do alto do meu sono, eu desafio o mundo a me surpreender hoje.
Mas é muito improvável que qualquer coisa nova aconteça...
... Assim como na vida dos botões das camisas
Em um dia em que ninguém vai desabotoá-los com desejo de nudez.
Mas estou aqui respirando deste ar,
Observando o não-movimento de um dia normal.
E acordei descrente.
30 de abr. de 2010
Eu não sei tocar
Faço qualquer coisa.
Ainda que seja algo momentâneo,
Ainda que eu esteja subjugada.
É que observar os criativos me angustia.
E diante da minha impotência musical,
Abro meus ouvidos para as notas de ninguém
E as minhas fantasias pras falácias que me invadem.
Em um jeito de flutuar delicados sorrisos de canto de boca,
Eu permito que alguém rabisque o canto do meu papel amassado.
E assim, em uma despretenciosa noite de segunda feira
Me ponho a repensar a vida de maneira sonora.
As sonoridades evasivas e insandecidas de mundo,
Em toda a sua precisão de melodias que me divertem.
Elas se desenham como canção.
Tomam conta dos ouvidos.
Ao final dos acordes, a missão foi cumprida.
E como resquício disso tudo fica um zumbido fino
Restam os sorrisos de canto de boca
E este texto, talvez.
22 de abr. de 2010
Adiante
Bocejo comprido.
Seria um pouco de pedir arrego do mundo.
Da sensação de estar viva.
De ver o tempo passar cruel e sarcástico, olhando pras minhas cicatrizes de guerra
E pra grande ingenuidade que tenho ao usar os dias que me são permitidos viver.
E apesar do meu sono quase irreversível,
Tudo isso é doce.
Sinto prazer em todas as coisas.
Me causa gosto ver o cansaço no espelho,
os sinais da luta derradeira,
e o sarcasmo do mundo.
Estou satisfeita com o gasto,
Todas as guerras foram válidas.
Tenho na garganta uma sensação macia de quase vitória.
E já quase posso tocar meu troféu.
Mas como essas são linhas cheias de "quase",
então fico com sono.
Devo descansar os meus poros antes de seguir em frente.
Quero chegar adiante com meu cheiro de gente renovado.
4 de abr. de 2010
O velho pijama
Sigo posta a pensar no começar de novo.
Ainda que sejam coisas velhas,
Quinquilharias de tempo e espaço.
Mas é sempre interessante repensá-las.
E com esse novo olhar de ver nas coisas antigas, novos detalhes
Eu observo o meu pijama preferido descosturado.
Vejo novos olhos maquiados no espelho.
Tenho um novo espelho, até.
Eu descubro novidades naquele velho rapaz.
Eu o desço do altar, lhe olhando nos olhos
E nesses olhos que não me são novos de observar
Vejo um brilho muito mais simples.
Vejo sangue humano nas veias,
Enxergo ambiguidade de gente.
Eu o guio pelas mãos ao meu espelho.
Ele poderá ver outras coisas na velha menina.
O quero com menos desespero,
Com a solidez das coisas reais,
Sem a avidez de sonhos de rodopiar.
Os meus olhos novos me mostraram o velho rapaz,
As suas rugas e calos,
E o meu pijama descosturado.
15 de mar. de 2010
A Viúva
Eu sei que já não se trata de sentir.
Conscientemente você já não me causa nada.
Nenhuma sensação que me traga embaraço ou outra coisa qualquer.
O fato é que já me acostumei.
Já se tornou um hábito pensar e repensar nossas histórias,
Olhar em sua direção quando você chega,
Provar dos seus beijos sem afeto,
Tocar seu corpo sem carinho.
Virou costume aquela coisa ruim de não me sentir querida.
Por vezes eu me canso dessa rotina,
Me entedio de não ter mais argumentos,
Me revolto com minha insistência.
E sem querer esses pensamentos que me atormentam
Me deito e vou dormir.
Eu sonho que estou te perdendo.
Que a morte te leva.
Eu velo o seu corpo.
Eu choro o meu pesar por sua vida que se acaba.
É o meu subconsciente te matando
Se livrando de você por mim.
Me alertando que é chegada a hora de esquecer.
Então um outro dia chega.
E eu acordo de luto,
Me sentindo uma viúva.
Jogo flores sobre nossa memória
Visto um preto sóbrio pra sair de casa
E me deleito no alívio do fim.
12 de mar. de 2010
Quando acaba
Que, de tão frequentes,
Fazem com que a tua presença já nem me cause mais espanto.
Já não me faz diferença.
Não me remete à saudade.
Não me entristece.
Estar com você passou a ter aquele ar de melancoliazinha sutil.
Talvez seja só no meu mundo em que a presença, o calor e o sorriso sejam fundamentais.
Por fim, tudo está tão exaurido
que as palavras me faltam.
E eu só queria dizer que...
já não tem mais graça.
8 de mar. de 2010
Em terra de Saci...
Aquela neurose de falsas idéias, a necessidade de atualização.
De saber e entender o que se passa no cotidiano parasitário da maioria das pessoas.
E sendo assim, fico contente por negar o que o mundo me oferece.
Pisar descalça.
Me apego ao conforto de construir meus próprios tópicos e vestidos e interesses.
Não, eu não vi. Eu não sei. Não prestei atenção.
Não acho bonita essa moda.
Não entendo das paradas de sucesso.
Não me venham com essas indecências modernas.
E nem me venham vocês pro lado de cá.
Não nos contaminemos...
Algo me diz que as tendências e certezas das notícias de hoje não combinam com meu casulo de reticências.
E enquanto houver esse estranhamento,
ficarei no meu lugar,
e serei feliz.
2 de mar. de 2010
A Receita
Fico farta de estar mergulhada na sua inconsistência contraditória.
Fico com preguiça de acordar cedo pra cumprir com os protocolos do tempo.
Esse tempo maluco que poderia ser medido simplesmente pela luminosidade e calor ou sua ausência.
Mas que vira prazos neuróticos te colocando à beira do abismo. E tenho que estar sempre dentro do prazo.
Pode ser que eu não faça nada, que simplesmente não haja nada a ser feito,
Mas eu tenho que estar de corpo presente, demonstrando maturidade e produtividade aos senhores do mundo.
Ao meu superego criado e domesticado.
Tudo isso me dá sono. Me dá vontade de ter nascido planta.
Ao menos se eu fosse planta, eu não teria tanta consciência do meu estado medíocre de gente desencontrada.
Então, o mundo das neuroses me acostuma a ler mensagens rápidas,
a decodificar qualquer coisa sem ter que sentí-la.
E, mais importante e rápido que tudo isso, a seguir em frente como um veículo de carga que transporta os bens de exportação: não olha pra trás, não pára.
Ao final dessas doses de consciência absurda,
as minhas juntas foram se enrijecendo.
Foi ficando cada vez maior a minha dificuldade de dar as mãos, abraçar ou mesmo de tocar suavemente a pontinha das orelhas.
E de tanto estar estática, a minha cabeça dói,
existe qualquer coisa que não cabe mais dentro do meu peito.
Mas existe também a solução ideal!
Eles me receitam uns ansiolíticos
que vão me transformar em planta e me ajudar a não-viver.
28 de fev. de 2010
Goiânia daquela confusão, do último dia do mês de fevereiro de 2010
Pra escrever as mesmas palavras sobre sentimentos velhos.
E roda na vitrola uma mesmíssima música
Sem parar.
Incessantemente no meu ouvido,
No meu santuário sagrado de sentir.
Ele canta sem saber bem porquê,
Sem saber do que se trata,
Como funciona,
E longe...
... bem longe de compreender.
Canta sobre amor, palavras, espaços tristes...
Sobre cantar junto,
Ele canta sobre você
E todas aquelas coisas de você que me confundem.
E então o som do violoncelo penetra a minha confusão,
Fita os meus olhos petrificados, assustados
E as minhas mãos que não reagem.
Os gritos da música me chacoalham,
Me berram que é delicado.
Mas tudo o que eu vejo, é que não significa nada pra você.
E quando eu quis que fôssemos como nunca antes,
Acho que meus desejos traíram o óbvio.
E eu acabo o verso entendendo que às vezes é preciso recuar.
27 de fev. de 2010
When nobody's watching
We might take it home
We might make out when nobody's there
It's not that we're scared
It's just that it's delicate
So why do you fill my sorrow
With the words you've borrowed
From the only place you've known
And why do you sing Hallelujah
If it means nothing to you
Why do you sing with me at all?
We might live like never before
When there's nothing to give
Well how can we ask for more
We might make love in some sacred place
The look on your face is delicate
So why do you fill my sorrow
With the words you've borrowed
From the only place you've known
And why do you sing Hallelujah
If it means nothing to you
Why do you sing with me at all?
Delicate - Damien Rice
(That´s so me today...)
20 de jan. de 2010
Da arte da reincidência
Simplesmente desaprendera a se amar.
Perdeu a chance de contar estrelas,
a mediocridade de ser poeta.
Perdeu por entre os dedos a capacidade de forjar palavras e desejos e idéias.
Por um instante, quase perdera também a inspiração.
É que se lhe escapava o gosto da escova de dentes antes de dormir, também já não queria o pente nos cabelos, não quereria alinhar os seus cachos.
Ele não passava mais perfume, e deixou de prestar atenção nas unhas e nos botões da camisa que incomodavam a barriga.
De repente ele não quis mais se levantar ou mover os braços.
E por odiar com profundidade a pena telúrica das mulheres que oram, se pôs a sair dali.
Mas depois de chorar suas lágrimas arrependidas de cansaço, ele olhou para si mesmo através de seu umbigo e do que antes fosse qualquer cordão umbilical pra fora, limpou nas mangas a meleca do nariz, e afirmou:
"Ainda não desisti de mim!"