15 de mar. de 2010

A Viúva

Por você ser minha obsessão
Eu sei que já não se trata de sentir.
Conscientemente você já não me causa nada.
Nenhuma sensação que me traga embaraço ou outra coisa qualquer.

O fato é que já me acostumei.
Já se tornou um hábito pensar e repensar nossas histórias,
Olhar em sua direção quando você chega,
Provar dos seus beijos sem afeto,
Tocar seu corpo sem carinho.
Virou costume aquela coisa ruim de não me sentir querida.

Por vezes eu me canso dessa rotina,
Me entedio de não ter mais argumentos,
Me revolto com minha insistência.
E sem querer esses pensamentos que me atormentam
Me deito e vou dormir.

Eu sonho que estou te perdendo.
Que a morte te leva.
Eu velo o seu corpo.
Eu choro o meu pesar por sua vida que se acaba.
É o meu subconsciente te matando
Se livrando de você por mim.
Me alertando que é chegada a hora de esquecer.

Então um outro dia chega.
E eu acordo de luto,
Me sentindo uma viúva.
Jogo flores sobre nossa memória
Visto um preto sóbrio pra sair de casa
E me deleito no alívio do fim.

12 de mar. de 2010

Quando acaba

Ando fatigada das tuas ausências.
Que, de tão frequentes,
Fazem com que a tua presença já nem me cause mais espanto.
Já não me faz diferença.
Não me remete à saudade.
Não me entristece.
Estar com você passou a ter aquele ar de melancoliazinha sutil.
Talvez seja só no meu mundo em que a presença, o calor e o sorriso sejam fundamentais.
Por fim, tudo está tão exaurido
que as palavras me faltam.
E eu só queria dizer que...
já não tem mais graça.

8 de mar. de 2010

Em terra de Saci...

E por mais que eu não queira, subitamente me vejo acometida pelos assuntos populares.
Aquela neurose de falsas idéias, a necessidade de atualização.
De saber e entender o que se passa no cotidiano parasitário da maioria das pessoas.
E sendo assim, fico contente por negar o que o mundo me oferece.
Pisar descalça.
Me apego ao conforto de construir meus próprios tópicos e vestidos e interesses.
Não, eu não vi. Eu não sei. Não prestei atenção.
Não acho bonita essa moda.
Não entendo das paradas de sucesso.
Não me venham com essas indecências modernas.
E nem me venham vocês pro lado de cá.
Não nos contaminemos...
Algo me diz que as tendências e certezas das notícias de hoje não combinam com meu casulo de reticências.
E enquanto houver esse estranhamento,
ficarei no meu lugar,
e serei feliz.

2 de mar. de 2010

A Receita

Às vezes, eu fico cansada do mundo.
Fico farta de estar mergulhada na sua inconsistência contraditória.
Fico com preguiça de acordar cedo pra cumprir com os protocolos do tempo.
Esse tempo maluco que poderia ser medido simplesmente pela luminosidade e calor ou sua ausência.
Mas que vira prazos neuróticos te colocando à beira do abismo. E tenho que estar sempre dentro do prazo.
Pode ser que eu não faça nada, que simplesmente não haja nada a ser feito,
Mas eu tenho que estar de corpo presente, demonstrando maturidade e produtividade aos senhores do mundo.
Ao meu superego criado e domesticado.
Tudo isso me dá sono. Me dá vontade de ter nascido planta.
Ao menos se eu fosse planta, eu não teria tanta consciência do meu estado medíocre de gente desencontrada.
Então, o mundo das neuroses me acostuma a ler mensagens rápidas,
a decodificar qualquer coisa sem ter que sentí-la.
E, mais importante e rápido que tudo isso, a seguir em frente como um veículo de carga que transporta os bens de exportação: não olha pra trás, não pára.
Ao final dessas doses de consciência absurda,
as minhas juntas foram se enrijecendo.
Foi ficando cada vez maior a minha dificuldade de dar as mãos, abraçar ou mesmo de tocar suavemente a pontinha das orelhas.
E de tanto estar estática, a minha cabeça dói,
existe qualquer coisa que não cabe mais dentro do meu peito.
Mas existe também a solução ideal!
Eles me receitam uns ansiolíticos
que vão me transformar em planta e me ajudar a não-viver.